Em maio de 2023, os Ministros da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiram, no desfecho do Recurso Especial nº 2.059.278/SC, e por maioria dos votos, pela possibilidade de ser realizada a penhora e leilão de um imóvel, que já estava gravado por alienação fiduciária, para o pagamento de débitos condominiais.

A jurisprudência do STJ, até então, estava consolidada em posição contrária, no sentido da impossibilidade de penhora de imóvel garantido por alienação fiduciária, ainda que se trate de débitos condominiais. Segundo a linha de interpretação do STJ até então vigente, o devedor fiduciante é quem se responsabiliza pelo pagamento das despesas condominiais, enquanto estiver em posse direta. Assim, o patrimônio do credor fiduciário não poderia responder pela execução, pelo menos até que a propriedade fosse consolidada em seu nome (abordagem alinhada com a Lei de Alienação Fiduciária, nº 9.514/17).

No caso concreto, o condomínio localizado em Santa Catarina ingressou com uma ação de cobrança em face do adquirente da propriedade, em razão de débitos condominiais. Com a procedência da demanda, iniciou-se a fase de cumprimento de sentença, momento em que foi requerida a penhora do bem, após diversas tentativas de recebimento dos valores inadimplidos.

Os argumentos levados pelo condomínio credor em seu recurso ao STJ foram: (i) a natureza propter rem dos débitos de condomínio, que vinculam o imóvel à dívida; (ii) o aspecto social e a impossibilidade de privilégio do proprietário fiduciário em relação ao proprietário comum; (iii) a postura de alguns Tribunais estaduais em relação ao tema, que já vinham permitindo a constrição nesses casos, para a proteção da coletividade; e (vi) a extensão da Súmula 478 do STJ para os casos de alienação fiduciária, a qual estabelece a preferência dos créditos condominiais em relação aos hipotecários.

O inteiro teor do acórdão foi disponibilizado na data de 12 de setembro de 2023. O raciocínio empregado pelo Ministro Raul Araújo – que lavrou o voto vencedor – seria o de que, em casos similares a este, o credor fiduciário seja citado na execução, para que haja a adequada solução da lide. Além disso, pelo entendimento do Ministro, a legislação não isenta o proprietário fiduciário de realizar o pagamento, mas apenas aloca a responsabilidade inicial ao devedor fiduciante.  

Nesse contexto, a posição seria a de que os proprietários comuns não devem ser prejudicados em relação ao fiduciário, considerando que não pode haver nenhuma forma de tratamento especial por conta da operação de financiamento imobiliário. Assim, promovendo a citação do credor fiduciário no processo executório, possibilita-se a este realizar o pagamento, com direito de ressarcimento, ou deixar o bem ir à praça, habilitando-se ali para pedir o pagamento.

Embora ainda não seja possível afirmar se a posição do STJ será alterada a partir de agora – tendo em vista que na mesma semana, em 15 de setembro de 2023, foi publicado acórdão da 3ª Turma do STJ, confirmando a jurisprudência até então consolidada no sentido da impossibilidade de penhora de imóvel garantido por alienação fiduciária, ainda que se trate de débitos condominiais – o caso já vem influenciando a postura em outros julgamentos, como apontado no REsp nº 1.929.926/SP, em que o Min. Antônio Carlos Ferreira faz menção ao recurso de origem catarinense.

Portanto, o assunto deve ser acompanhado pelos credores fiduciários, revisitando-se as medidas preventivas no momento da contratação, para que se evite a inadimplência dos débitos condominiais, mas, principalmente, a perda da propriedade fiduciária, assim como os possíveis riscos a serem suportados nas negociações.

Eduardo Ribas / Lúcia de Medeiros Coutinho